Sala de Espera

  • Atomic Garden
    Idade: 19
    Lugar: Chapecó, SC.
    Condição: Frescura.
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    Idade: 19
    Lugar: Santo Ângelo, RS, no meio da roça missioneira.
    Condição: Demofobia e Nerdice Aguda. Foi ao Mundo Real duas vezes, durante as quais ganhou uns graus de miopia devido à exposição ao sol.
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    Idade: 20
    Lugar: Recife, PE. É o único do consultório que mora numa cidade de verdade.
    Condição: Psicose e Esquizofrenia. Obsessão compulsiva por filmes clássicos de terror brutal e trash em geral.

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Gazouiller

Por Vexille || 00:00:00 || 18 de abr. de 2006
Um dia desses, depois de ter acordado algumas horas mais tarde do que deveria para chegar no cursinho na hora, me aconteceu algo interessante. Ainda meio sonâmbulo, fui descendo as escadas quando o telefone tocou. Bateu aquele desespero momentâneo. Minha mãe descobrir que eu fiquei em casa não ia ser legal. Quando em chego no fim da escada, a empregada atende o telefone. Eu sossego por um instante, esperando que ela não fale nada, quando ela solta:

— Ah, ele tá aqui, quer falar com ele?

Fodeu. Por reflexo, levantei a mão num sinal negativo. Foi quando aconteceu o que eu menos esperava.

— Ahn, espera, ele não tá não. Eu me confundi, pensei que ele tivesse no quarto. É.

Como é que é? Ela tinha acabado de me dar cobertura e deixou por isso mesmo, sem fazer alguma chantagem envolvendo favores sexuais doentios ou minha carteira ficando consideravelmente mais leve? Um mundo mágico de oportunidades tinha acabado de abrir suas portas para mim!

Então me ocorreu. Algo estava terrivelmente errado. O gosto já não era mais o mesmo. A magia estava desaparecendo. Eu havia esquecido todos os princípios da gazeação-arte.

Gazear

do Fr. gazouiller

v. intr.,
     Faltar trabalho ou escola para vadiar ou divertir-se, em função de se obter sensações prazeirosas, orgasmáticas; Faltar algum compromisso;

Vamos, Pedrinho, precisamos gazear esta aula de química orgânica!

O conceito por trás da palavra é simples. Mas o seu significado verdadeiro e PROFUNDO vem se perdendo através das gerações. Assim como a punheta, a gazeação vem perdendo toda a sua graça e magia, aquela ginga marota e jocosa, perdendo o seu posto para a gazeação apática e despreocupada.

A gazeação-arte exige, antes de tudo, planejamento e estratégia. Desde técnicas prosaicas como ligar pro tio da condução e dizer que tá doente — tô com dor de cabeça, passando mal, sabe, acho que não vou poder ir hoje — e esperar que ele não resolva ligar pros teus pais pra passar a história a limpo, até técnicas mais avançadas e ousadas como ir comprar big bigs na barraquinha quando a condução te deixar no colégio, ficar lá até o carro ir embora, e começar a aventura gazeística a partir dali.

Ter o caminho livre na santidade do lar pode pôr tudo a perder na prática dessa arte milenar, por isso é de suma importância ter uma empregada filha da puta montando guarda na porta de casa, com o telefone dos teus pais na discagem rápida. E caso teus pais não sejam separados e sua mãe não seja moderninha e não faça questão de trabalhar para estabelecer padrões mais altos para a mulher da sociedade atual, como pessoa e como profissional, de modo a quebrar antigos paradigmas preconceituosos chovinistas, tu não tens com o que se preocupar, o efeito é o mesmo.

Estando impedido o caminho que te levaria de volta pra casa, tu és forçado a procurar outro abrigo até as doze e meia, entendendo o princípio básico da gazeação-arte: o prazer que vem puramente do ato de faltar uma aula. Contanto que não ocorra uma acomodação, tudo vale a pena. Até mesmo passar a manhã na praça de alimentação do Carrefour.



Mais ou menos como este Carrefour. Só que diferente

Fazer o esquema da ligação pro tio da condução. Sair de casa e dar uma passada na banca de revistas pra matar um tempinho e sacar as novidades; quem sabe, se aproveitar do fato de estar segurando uma revista e com uma bolsa nas costas e de um ponto cego atrás das prateleiras, onde o cara da banca não te vê. Finalmente, partir pro Carrefour e enrolar por lá até depois do meio dia. Este é o itinerário.

Tu imaginas que cerca de 30 corredores de um supermercado iriam te manter entretido por um tempo, mas ficar mazanzeando pela seção de vegetais não faz bem o meu ESTILO, se é que você me entende. Então o que sobra são o corredor dos cadernos e material escolar, a prateleira com joguinhos e CD-ROMs (como o fabuloso Curso De HTML HJ Software) e a parte que tinha os VHS's delícia, como Alien 3. Acho que também tinha uma parte de CDs de música. Será que já existia seção de CDs de música? Acho que sim.

Enfim, a diversão é limitada nos corredores e a mulé do café da manhã (mini cafézinho e micro pão de queijo) só faz o plantão na entrada durante dez minutos pra não gastar muito, então o negócio é se divertir na praça de alimentação do grande Carrefour.

E o que fazer numa praça de alimentação com a maioria das lanchonetes fechadas, o que nem importa tanto, já que tu tá liso? Qualquer coisa é um torvelinho de emoções numa situação dessas, desde rabiscar a parte de trás do caderno com bonecos psicóticos, até ler os novíssimos exemplares de GOOSEBUMPS, ou de alguma revistinha recém-surrupiada.



A Máscara Maldita, em sua versão gringana, um exemplar do tesão em forma de livretinho de terror

Com o tempo tu te acostuma com o carinha da McDonald's te olhando feio. Tá olhando o quê, PARCEIRO? Teu salário mínimo não me assusta.

E ainda rola o fator ADRENALINA, já que tu não tás em casa, e a qualquer momento, o diretor filho da puta pode sacar tua ausência e resolver dar uma ligadinha pra ver se "tá tudo bem". Tudo primeiríssima, meu chapa, agora segura o ovo de páscoa. Ainda há a possibilidade de encontrar um professor casualmente passeando pelo supermercado e te encontrar com roupa do colégio e mochila nas costas.

— Ahn, opa professor. Ah, é que eu tava passando mal e tal, aí não pude ir pro colégio, sabe... — O que é perfeitamente plausível, já que, como todo mundo sabe, garotos da sexta série quando estão passando mal o suficiente para faltar aula, correm pro Carrefour.

(Fato verídico.)

Enfim, espero que este pequeno ode à arte da gazeação sirva para instruir as gerações futuras, de modo que as antigas tradições não sejam esquecidas.

Lembre-se, o importante é usar a imaginação e a criatividade, e não a lábia pra cima da empregada. Guarde a lábia pra levá-la para o quartinho de trás para arrumar suas revistinhas do Cascão.

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