Briga estranha com gente esquisita, eu não tô legal
Por Lipedal || 14:08:00 || 7 de abr. de 2006
Doutor, sempre fui meio cagão em matéria de brigas ou coisa do tipo. A única vez na vida em que briguei saí com uma bolha na testa, do tamanho do meu joelho, latejando durante umas duas semanas. O cara fazia judô e tal, e eu acreditei na boa vontade dele quando fui correndo pra socar as costas do infeliz. Teve outra vez em que rolou briga numa festa. Tentei apartar, mas meus 50 e poucos quilos não me deixaram ficar parado no chão. Voei pro canto da sala, enquanto lá no centro voavam enfeites de cristal, copos, garrafas, cadeiras, mesas, camas. Um dos machões saiu sem um pedaço do couro cabeludo, ameaçando matar o outro. A casa foi trancada e eu fiquei lá tremendo por algumas horas. As meninas mais frescas da turma tentavam me tranqüilizar com água e açúcar, pra se ter uma idéia.
Mas segunda-feira aconteceu algo interessante, diferente. Estava eu voltando da rodoviária, descendo uma avenida, quando duas caminhonetes passaram zunindo do meu lado. Caminhei uns metros mais e POU, ouvi um barulho de batida. Olhei para ver o que tinha acontecido, e a caminhonete de trás tinha arrebentado a fuça na traseira da outra. Uau, que doido, nunca tinha visto uma batida! Continuei andando, mas olhando para trás, pra ver como eles iam se acertar. Mas eles não se acertaram. Aconteceu o que eu não esperava: a de trás bateu e continuou andando, levando a da frente em direção à calçada. Alcança esse papel aí, doutor. Mais ou menos assim:
A essa hora eu já tinha parado pra assistir. A caminhonete de trás só podia estar com algum problema no freio, no motor, sei lá. Mas só pra divertir as velhas fofoqueiras mais um pouquinho, a da frente parou bruscamente, e de dentro dela saiu um careca segurando um pedaço de ferro de um metro de comprimento. Tá bom, mentira. Eu tava a meia quadra de distância, como ia saber que tinha um metro? Mas era mais ou menos desse tamanho, talvez um pouco maior.
Nesse instante o de trás já tinha saltado pra fora, usando a porta como barreira. E te digo, se não fosse ela eu teria visto o milagre da multiplicação se aplicando à cabeça do cara. E não ia ser bonito. O careca provavelmente tinha assistido Matrix Reloaded na noite anterior, e agora agitava aquela barra desesperadamente. O outro deve ter tomado umas nos dedos, mas enfim conseguiu segurar o ferro e se deitar por cima do berserker. Ficaram rolando na rua durante algum tempo, e então foram pra grama no meio da avenida, sempre em meio a chutes e cabeçadas, enquanto seguravam o cano (cano, ferro, vou saber?). Eu olhava aquilo meio arrepiado, sem saber se era certo ficar assistindo sem tentar apartar, chamar a polícia ou algo assim. Mas afinal eu tava a meia quadra de distância, tinha gente encostando nos caras e não faziam nada.
Finalmente alguém macho na multidão resolveu apartar: uma velha (?) foi incrementar a coreografia batendo nos dois (??) com um rolo de amassar pão (???). Imagine você voltando da rodoviária e presencia uma caminhonete encoxando outra, depois um cara saindo com um cano de dentro do automóvel, e agora uma velha com um rolo de amassar pão se atirando aos homens! E o mais estranho é que nenhum (ou quase nenhum) carro passou pela rua durante a treta. Já assistiu O Show de Truman, Doutor? Muito esquisito. Acho que tô com princípio de paranóia depois disso. Aquilo aí no canto não é uma câmera? Esquece.
Havia também dois cachorros admirando a cena. Um deles corria dum lado pro outro esperando que alguém desse atenção pra ele. O outro ficava parado no meio da rua olhando pro horizonte. E eis que a polícia aparece! Todo mundo abriu caminho, enquanto a viatura se dirigia a toda velocidade para o local da briga. O cãozinho carente de atenção ficou feliz da vida e começou a correr atrás do carro latindo para seus pneus. E lembra do cachorro olhando o horizonte?
Isso mesmo. A viatura correndo a módicos 100km/h no meio da rua cheia de gente, e o cachorrinho pensando na vida. Pensando agora, talvez ele fosse cego e surdo, e imaginava que a essa hora já tava na calçada fingindo admirar a briga. Coitado. Então a polícia freou, buzinou até o carro fazer bico e só depois disso o cachorrinho saiu, bem lentamente. Todo mundo na rua soltou um suspiro de alívio.
Os policiais estacionaram, saíram do carro e logo a briga acabou. Os machões agora pareciam crianças dizendo "mãe, ele me inticou!", sério. Se apontavam e gritavam: "foi ele, foi ele!". Aí a coisa ficou sem graça, porque isso eu vejo em casa todo dia. Fui saindo. O engraçado é que fui o primeiro a sair da cena do crime, o resto ficou lá, e mesmo assim a avenida inteira já tava sabendo da história e da vida dos caras. Se bobear já tinha gente floodando o Orkut deles. Passei na frente de uma casa e uma mulher dizia de peito estufado: "ih, esses eu conheço! Tão toda hora brigando, e dessa vez a coisa foi feia, dizque um saiu todo estrupiado". Sendo que eu seria o único provável portador da informação, não sei quem foi que "dizque" pra mulher, e considerando que a casa dela ficava a quatro quadras da briga, não sei como ela conhecia os caras sem nem ter visto quem brigou...
Mas é uma peculiaridade interessante do orgulho humano. Logo todo mundo tava comentando o acontecido como se tivesse apertado a mão dos caras enquanto eles se pauleavam. Uma velha dizia que eram cinco caminhonetes, outra dizia que um avião tinha caído e feito as duas baterem, e ainda outra contava que o ferro era filho dela e o cachorro tinha fugido de casa pra ir apartar a briga. Cada um tinha visto uma coisa, cada rodinha de conversa contava a história de modo diferente.
Mas a minha versão é a certa, doutor. A minha versão é a certa.
Mas segunda-feira aconteceu algo interessante, diferente. Estava eu voltando da rodoviária, descendo uma avenida, quando duas caminhonetes passaram zunindo do meu lado. Caminhei uns metros mais e POU, ouvi um barulho de batida. Olhei para ver o que tinha acontecido, e a caminhonete de trás tinha arrebentado a fuça na traseira da outra. Uau, que doido, nunca tinha visto uma batida! Continuei andando, mas olhando para trás, pra ver como eles iam se acertar. Mas eles não se acertaram. Aconteceu o que eu não esperava: a de trás bateu e continuou andando, levando a da frente em direção à calçada. Alcança esse papel aí, doutor. Mais ou menos assim:
A essa hora eu já tinha parado pra assistir. A caminhonete de trás só podia estar com algum problema no freio, no motor, sei lá. Mas só pra divertir as velhas fofoqueiras mais um pouquinho, a da frente parou bruscamente, e de dentro dela saiu um careca segurando um pedaço de ferro de um metro de comprimento. Tá bom, mentira. Eu tava a meia quadra de distância, como ia saber que tinha um metro? Mas era mais ou menos desse tamanho, talvez um pouco maior.
Nesse instante o de trás já tinha saltado pra fora, usando a porta como barreira. E te digo, se não fosse ela eu teria visto o milagre da multiplicação se aplicando à cabeça do cara. E não ia ser bonito. O careca provavelmente tinha assistido Matrix Reloaded na noite anterior, e agora agitava aquela barra desesperadamente. O outro deve ter tomado umas nos dedos, mas enfim conseguiu segurar o ferro e se deitar por cima do berserker. Ficaram rolando na rua durante algum tempo, e então foram pra grama no meio da avenida, sempre em meio a chutes e cabeçadas, enquanto seguravam o cano (cano, ferro, vou saber?). Eu olhava aquilo meio arrepiado, sem saber se era certo ficar assistindo sem tentar apartar, chamar a polícia ou algo assim. Mas afinal eu tava a meia quadra de distância, tinha gente encostando nos caras e não faziam nada.
Finalmente alguém macho na multidão resolveu apartar: uma velha (?) foi incrementar a coreografia batendo nos dois (??) com um rolo de amassar pão (???). Imagine você voltando da rodoviária e presencia uma caminhonete encoxando outra, depois um cara saindo com um cano de dentro do automóvel, e agora uma velha com um rolo de amassar pão se atirando aos homens! E o mais estranho é que nenhum (ou quase nenhum) carro passou pela rua durante a treta. Já assistiu O Show de Truman, Doutor? Muito esquisito. Acho que tô com princípio de paranóia depois disso. Aquilo aí no canto não é uma câmera? Esquece.
Havia também dois cachorros admirando a cena. Um deles corria dum lado pro outro esperando que alguém desse atenção pra ele. O outro ficava parado no meio da rua olhando pro horizonte. E eis que a polícia aparece! Todo mundo abriu caminho, enquanto a viatura se dirigia a toda velocidade para o local da briga. O cãozinho carente de atenção ficou feliz da vida e começou a correr atrás do carro latindo para seus pneus. E lembra do cachorro olhando o horizonte?
Isso mesmo. A viatura correndo a módicos 100km/h no meio da rua cheia de gente, e o cachorrinho pensando na vida. Pensando agora, talvez ele fosse cego e surdo, e imaginava que a essa hora já tava na calçada fingindo admirar a briga. Coitado. Então a polícia freou, buzinou até o carro fazer bico e só depois disso o cachorrinho saiu, bem lentamente. Todo mundo na rua soltou um suspiro de alívio.
Os policiais estacionaram, saíram do carro e logo a briga acabou. Os machões agora pareciam crianças dizendo "mãe, ele me inticou!", sério. Se apontavam e gritavam: "foi ele, foi ele!". Aí a coisa ficou sem graça, porque isso eu vejo em casa todo dia. Fui saindo. O engraçado é que fui o primeiro a sair da cena do crime, o resto ficou lá, e mesmo assim a avenida inteira já tava sabendo da história e da vida dos caras. Se bobear já tinha gente floodando o Orkut deles. Passei na frente de uma casa e uma mulher dizia de peito estufado: "ih, esses eu conheço! Tão toda hora brigando, e dessa vez a coisa foi feia, dizque um saiu todo estrupiado". Sendo que eu seria o único provável portador da informação, não sei quem foi que "dizque" pra mulher, e considerando que a casa dela ficava a quatro quadras da briga, não sei como ela conhecia os caras sem nem ter visto quem brigou...
Mas é uma peculiaridade interessante do orgulho humano. Logo todo mundo tava comentando o acontecido como se tivesse apertado a mão dos caras enquanto eles se pauleavam. Uma velha dizia que eram cinco caminhonetes, outra dizia que um avião tinha caído e feito as duas baterem, e ainda outra contava que o ferro era filho dela e o cachorro tinha fugido de casa pra ir apartar a briga. Cada um tinha visto uma coisa, cada rodinha de conversa contava a história de modo diferente.
Mas a minha versão é a certa, doutor. A minha versão é a certa.
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